Ao recusarmo-nos a trabalhar nossa decepção, quebramos os Preceitos: em vez de vivenciá-la, recorremos à raiva, à cobiça, à intriga, à crítica. Contudo, proveitoso é justamente o momento em que podemos ser a decepção e, caso não estejamos dispostos a tanto, pelo menos deveríamos notar que não o estamos. O momento de uma decepção é um presente de vida incomparável que recebemos muitas vezes por dia, se estivermos atentos. Esse presente sempre acontece na vida das pessoas; é aquele momento em que sentimos que: "Não foi bem assim que planejei".
Uma vez que a vida diária se movimenta com rapidez, nem sempre temos a clareza de perceber o que está se passando. Mas quando sentamos na calma podemos observar e vivenciar nossa decepção. Sentar todo dia é nosso pão com manteiga, o conteúdo básico do dharma. Sem ele, é fácil nos confundirmos.
É preciso coragem para se sentar bem. O zen não é uma disciplina para todos. Precisamos estar dispostos a fazer algo que não é fácil. Se o fizermos com paciência e perseverança, com a orientação de um bom instrutor, então, aos poucos, nossa vida irá se aquietar, ficar mais equilibrada. Nossas emoções não serão mais tão dominadoras. Enquanto sentamos, descobrimos que a primeira coisa, a mais elementar, para trabalhar, é nossa mente caótica, ocupada. Estamos todos enredados num pensar frenético e o problema da prática está em começar a trazer esse pensamento para a claridade e o equilíbrio. Quando a mente fica limpa, clara, equilibrada, e não mais prisioneira dos objetos, então poderá haver uma abertura e, por um instante, nos, daremos conta de quem somos, na verdade.
(Charlotte Joko Beck. Sempre Zen.
Charlotte Joko Beck faleceu dia 15/06. Ela fundou o Zen Center of San Diego e o Ordinary Mind Zen School. Também escreveu dois livros que são considerados clássicos modernos do Zen: Nada de Especial (Nothing Special: Living Zen) e Sempre Zen (Everyday Zen: Love and Work).
De acordo com a conta Twitter da professora de Zen Joan Halifax Roshi, suas últimas palavras foram, “Isto também é maravilha.” (“This too is wonder.”).
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