terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O Zen Peacemakers e Sensei Paco


Escrevi para o blog Zen Vale dos Sinos um depoimento sobre o Seshin de Paranirvana de Buda no Vila Zen.
Eu o reproduzo aqui.

BREVE DEPOIMENTO SOBRE O SESHIN DE PARANIRVANA DE BUDA COM A PRESENÇA AUSPICIOSA DE MONGES DA ORDEM ZEN PEACEMAKERS




Monja Kokai me pediu que registrasse neste blog algo da experiência vivida com a presença do Sensei Paco Lugoviña e de seu aluno Daiken Nelson, do Zen Peacemakers, no Seshin de Paranirvana de Buda na Vila Zen, em Viamão, RS, no Carnaval. Eu sabia da existência do Zen Peacemakers antes desse encontro, mas não estava atenta a ela. Felizmente, isso mudou.

Não é fácil, se não impossível, descrever a intensidade daqueles dois dias em que eles estiveram entre nós. Ovídio Waldemar, representante do Zen Peacemakers no Brasil e associado do Via Zen, nos propiciou esta oportunidade de convivermos dois dias com Sensei Paco e Daiken Nelson, e por isso sou extremamente grata.

A primeira surpresa do encontro foi saber que o Zen Peacemakers tem o objetivo de inovar criativamente o Zen, adaptando-o à cultura ocidental. É uma ordem Zen própria, criada pelo mestre Zen Roshi Bernie Glassman em 1995. Como acredito que o crescimento do Zen no Brasil depende de sua adaptação à cultura ocidental – brasileira, latino-americana –, foi com grande interesse que acompanhei a exposição de Sensei Paco. Bernie Glassman foi aluno de Maezumi Roshi, também professor de Monja Coen em Los Angeles (maiores detalhes sobre a fundação e atividades do Zen Peacemakers podem ser encontradas nos sites do Via Zen http://www.viazen.org.br/si/site , Zen do Brasil http://www.zendobrasil.org.br/si/site, Monja Coen http://www.monjacoen.com.br/ , além do site oficial  da entidade http://www.zenpeacemakers.org/).

Na ordem Zen Peacemarkes, os valores budistas são traduzidos em linguagem da cultura ocidental. Assim os “três tesouros” podem ser expressos por Unidade (a natureza desperta de todos os seres), Diversidade (o oceano de sabedoria e compaixão) e Harmonia (a interdependência de tudo que existe). A sanga se compromete com três máximas: (1) não saber (mente de principiante; abandonar idéias fixas sobre eu mesma e o universo); (2) testemunhar a alegria e o sofrimento do mundo (agir depois de compreender profundamente); (3) agir amorosamente (agir sempre construtivamente). Tudo isso se manifesta através do esforço dedicado de indivíduos e grupos que expressam a interconexão e a unidade da vida nos mosteiros, no trabalho, nas famílias e na comunidade. Sensei Paco, ao relatar e explicar como funcionam os retiros de rua e os em Auschwitz, mostrou como estes preceitos estão presentes em cada atitude. Tudo tem razão se ser. Foi emocionante!

Como disse Sensei Paco, o Zen Peacemakers permitiu que ele desse a sua atuação social uma dimensão espiritual. Agir socialmente - ativismo social - se tornou sua prática zen. Ele encontrou o caminho no chamado budismo engajado. Assim como a ordem de Thich Naht Hanh – Ordem do Interser – busca enraizar-se no mundo e na vida de todos, aproximar-se do sofrimento de todos os que necessitam e oferecer-lhes ajuda e cura, a Ordem do Zen Peacemakers compreende o caminho de Buda como uma maneira de desenvolver a generosidade e a compaixão por meio do trabalho social junto à comunidade.

A segunda surpresa do encontro foi a extroversão de Sensei Paco, sua disponibilidade e vigor, apesar de seus 70 e poucos anos. Ele é o exemplo vivo da filosofia Zen Peacemakers: Unidade, Diversidade e Harmonia. Em sua prática não há exclusão. Na verdade, ele vive o Zen, e sem dispensar o bom humor e a diversão. Fizemos sazen, aprendemos sobre os retiros de rua e em Auschwitz e sobre as inúmeras atividades e práticas do Zen Peacemakers, e com isso pudemos também nos conhecer melhor. E tudo foi muito divertido.

Eu sinceramente acredito que o Zen, para crescer no Brasil, deve incorporar essa atitude diante da vida e da prática. Usar o “nariz de palhaço”, de que nos falou Sensei Paco. O bom humor, a alegria, o contato físico fazem parte de nossa alma latino-americana. O verdadeiro Zen não é sinônimo de sisudez e frieza, que, aliás, não fazem parte de nossa cultura. Iniciávamos a prática com o silêncio do sazen e depois seguíamos com a fala dele ou de Daiken, com exposições vivas e extrovertidas.

Saí do retiro extremamente sensibilizada pelo trabalho que o Zen Peacemakers desenvolvem em Nova Iorque e que Ovídio Waldemar coordena em Viamão e em Porto Alegre. Entendi o esforço de Ovídio em nos propiciar essa rica vivência em nosso Seshin como a sinalização de uma opção real e intensa para o Via Zen e para o Zen Vale dos Sinos.

Como disse Sensei Paco, a ordem Zen Peacemakers se preocupa em propiciar causas e condições para mudar a vida das pessoas que sofrem e que necessitam de ajuda. Para realizar isso, devemos corrigir nossos desequilíbrios. Essa máxima me tocou profundamente – Como corrigir meus desequilíbrios? Creio que essa indagação vale para todos nós, pessoalmente, e para as comunidades das duas sangas envolvidas (que, na verdade, são uma só).

Gasshô,

Eduarda Kobun

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Mente de principiante

"Há muitas possibilidades na mente do principiante, mas poucas na do perito" (Suzuki, Shunryu).